quarta-feira, 18 de julho de 2007

Verdadeira regeneração

Ryokan devotou sua vida ao estudo do Zen. Um dia ele ouviu que seu sobrinho, a despeito das advertências de sua família, estava gastando seu dinheiro com uma prostituta. Uma vez que o sobrinho tinha substituído Ryokan na responsabilidade de gerenciar os proventos da família, e os bens desta portanto corriam risco de serem dissipados, os parentes pediram a Ryokan fazer algo.
Ryokan teve que viajar por uma longa estrada para encontrar seu sobrinho, o qual ele não via há muitos anos. O sobrinho ficou grato por encontrar seu tio novamente e o convidou a pernoitar em sua casa.
Por toda a noite Ryokan sentou em meditação. Quando ele estava partindo na manhã seguinte ele disse ao jovem: "Eu devo estar ficando velho, minhas mãos tremem tanto! Poderia me ajudar a amarrar minha sandália de palha?"
O sobrinho o ajudou devotadamente. "Obrigado," disse Ryokan finalmente, "você vê, a cada dia um homem se torna mais velho e frágil. Cuide-se com atenção." Então Ryokan partiu, jamais mencionando uma palavra sobre a cortesã ou as reclamações de seus parentes. Mas, daquela manhã em diante, o esbanjamento do seu neto terminou.

domingo, 17 de junho de 2007

Livros

Hsüan-Chien, quando jovem, era um devoto estudante do buddhismo. Estudou muito os conceitos e as doutrinas, e tornou-se muito hábil em analisar os termos complexos, e se considerava um expert em filosofia buddhista. Aprendeu de cor o Sutra do Diamante, e orgulhosamente escreveu um longo comentário sobre ele.
Um dia, sabendo que em Hunan havia um grande sábio que dizia coisas que ele não concordava, resolveu viajar até lá para provar, através de seu conhecimento, que o pretenso sábio estava errado. Ele pegou seu comentário Qinglong sobre o Sutra do Diamante e partiu.
No caminho, encontrou uma velha que vendia bolinhos de arroz. Cansado e com fome, falou à senhora:
"Gostaria de comprar alguns bolinhos, por favor."
"Que livros está carregando? ", perguntou a velha.
"É o meu comentário sobre o sentido verdadeiro do Sutra do Diamante," disse orgulhoso," mas você não sabe nada sobre esses assuntos profundos."
Após um pequeno momento em silêncio, a velha lhe disse:
"Vou lhe fazer uma pergunta, e se puder me responder eu lhe darei os bolinhos de graça. Se não, terá que ir embora, pois não vou lhe vender os bolinhos."
Achando-se capaz de responder qualquer pergunta, quanto mais de uma pessoa sem os seus anos de conhecimentos nos termos filosóficos, disse:
"Muito bem, pergunte-me".
"Está escrito no Vajracchedika que a Mente do passado é inatingível, a Mente do futuro é inatingível e a Mente do presente é inatingível; diga-me então: com qual Mente você vai se alimentar?"
Estupefato, Hsüan-chien não soube o que dizer. A velha levantou-se e comentou:
"Sinto muito, mas acho que terá que se alimentar em outro lugar", e partiu.
Quando chegou no seu destino encontrou Longtan, o mestre do templo. Tinha chegado tarde, e ainda abalado com o encontro anterior, sentou-se silenciosamente em frente ao mestre, esperando que ele iniciasse o debate. O mestre, após muito tempo, disse:
"É muito tarde, e você está cansado. É melhor ir para seu quarto dormir."
"Muito bem," disse o intelectual, levantou-se e começou a sair para a escuridão do corredor. O mestre veio de dentro do salão e comentou:
"Está muito escuro, tome, leve esta vela acesa," e lhe passou uma das velas acesas do altar. Quando Hsüen-chien pegou a vela trazida pelo mestre, Longtan subitamente assoprou-a, apagando a luz e deixando ambos silenciosos em meio à escuridão. Neste momento Hsüan-chien atingiu o Satori.
No dia seguinte, levou todos seus livros e comentários para o pátio e os queimou.

sexta-feira, 8 de junho de 2007

Uma xícara de Chá

Nan-In, um mestre japonês durante a era Meiji (1868-1912), recebeu um professor de universidade que veio lhe inquirir sobre Zen. Este iniciou um longo discurso intelectual sobre suas dúvidas.
Nan-In, enquanto isso, serviu o chá. Ele encheu completamente a xícara de seu visitante, e continuou a enchê-la, derramando chá pela borda.
O professor, vendo o excesso se derramando, não pode mais se conter e disse:
"Está muito cheio. Não cabe mais chá!"
"Como esta xícara," Nan-in disse, "você está cheio de suas próprias opiniões e especulações. Como posso eu lhe demonstrar o Zen sem você primeiro esvaziar sua xícara?"

domingo, 13 de maio de 2007

Desfazendo Equívocos

Se você quer milagres, não procure o budismo. O supremo milagre para o budismo é você lavar seu prato depois de comer.

Se você quer curar seu corpo físico, não procure o budismo. O budismo só cura os males de sua mente: ignorância, cólera e desejos desenfreados.

Se você quiser arranjar emprego ou melhorar sua situação financeira, não procure o budismo. Você se decepcionará, pois ele vai lhe falar sobre desapego em relação aos bens materiais. Não confunda, porém, desapego com renúncia.

Se você quer poderes sobrenaturais, não procure o budismo. Para o budismo, o maior poder sobrenatural é o triunfo sobre o egoísmo.

Se você quer triunfar sobre seus inimigos, não procure o budismo. Para o budismo, o único triunfo que conta é o do homem sobre si mesmo.

Se você quer a vida eterna em um paraíso de delícias, não procure o budismo, pois ele matará seu ego aqui e agora.

Se você quer massagear seu ego com poder, fama, elogios e outras vantagens, não procure o budismo. A casa de Buda não é a casa da inflação dos egos.

Se você quer a proteção divina, não procure o budismo. Ele lhe ensinará que você só pode contar consigo mesmo.

Se você quer um caminho para Deus, não procure o budismo. Ele o lançará no vazio.

Se você quer alguém que perdoe suas falhas, deixando-o livre para errar de novo, não procure o budismo, pois ele lhe ensinará a implacável Lei de Causa e Efeito e a necessidade de uma autocrítica consciente e profunda.

Se você quer respostas cômodas e fáceis para suas indagações existenciais, não procure o budismo. Ele aumentará suas dúvidas.
Se você quer uma crença cega, não procure o budismo. Ele o ensinará a pensar com sua própria cabeça.

Se você é dos que acham que a verdade está nas escrituras, não procure o budismo. Ele lhe dirá que o papel é muito útil para limpar o lixo acumulado no intelecto.

Se você quer saber a verdade sobre os discos voadores ou sobre a civilização de Atlântida, não procure o budismo. Ele só revelará a verdade sobre você mesmo.

Se você quer se comunicar com espíritos, não procure o budismo. Ele só pode ensinar você a se comunicar com seu verdadeiro eu.

Se você quer conhecer suas encarnações passadas, não procure o budismo. Ele só pode lhe mostrar sua miséria presente.

Se você quer conhecer o futuro, não procure o budismo. Ele só vai lhe mandar prestar atenção a seus pés, enquanto você anda.

Se você quer ouvir palavras bonitas, não procure o budismo. Ele só tem o silêncio a lhe oferecer.

Se você quer ser sério e austero, não procure o budismo. Ele vai ensiná-lo a brincar e a se divertir.

Se você quer brincar e se divertir, não procure o budismo. Ele o ensinará a ser sério e austero.

Se você quer viver, não procure o budismo, pois ele o ensinará a morrer.

Se você quer morrer, não procure o budismo, pois ele o ensinará a viver.


Reverenda Yvonette Silva Gonçalves

segunda-feira, 2 de abril de 2007

Buddha Cristão

Um dos monges do mestre Gasan visitou a universidade em Tokyo. Quando ele retornou, ele perguntou ao mestre se ele jamais tinha lido a Bíblia Cristã.

"Não," Gasan replicou, "Por favor leia algo dela para mim."

O monge abriu a Bíblia no Sermão da Montanha em São Mateus, e começou a ler. Após a leitura das palavras de Cristo sobre os lírios no campo, ele parou. Mestre Gasan ficou em silêncio por muito tempo.

"Sim," ele finalmente disse, "Quem quer que proferiu estas palavras é um ser iluminado. O que você leu para mim é a essência de tudo o que eu tenho estado tentando ensinar a vocês aqui."

quarta-feira, 14 de março de 2007

O Agora

Um guerreiro japonês foi capturado pelos seus inimigos e jogado na prisão. Naquela noite ele sentiu-se incapaz de dormir pois sabia que no dia seguinte ele iria ser interrogado, torturado e executado. Então as palavras de seu mestre Zen surgiram em sua mente:

"O "amanhã" não é real. É uma ilusão. A única realidade é "AGORA. O verdadeiro sofrimento é viver ignorando este Dharma".

Em meio ao seu terror subitamente compreendeu o sentido destas palavras, ficou em paz e dormiu tranqüilamente.

terça-feira, 13 de março de 2007

É mesmo?

Uma linda garota da vila ficou grávida. Seus pais, encolerizados, exigiram saber quem era o pai. Inicialmente resistente a confessar, a ansiosa e embaraçada menina finalmente acusou Hakuin, o mestre Zen o qual todos da vila reverenciavam profundamente por viver uma vida digna. Quando os insultados pais confrontaram Hakuin com a acusação de sua filha, ele simplesmente disse:

"É mesmo?"

Quando a criança nasceu, os pais a levaram para Hakuin, o qual agora era visto como um pária por todos da região. Eles exigiram que ele tomasse conta da criança, uma vez que essa era sua responsabilidade.

"É mesmo?" Hakuin disse calmamente enquanto aceitava a criança.

Por muitos meses ele cuidou carinhosamente da criança até o dia em que a menina não agüentou mais sustentar a mentira e confessou que o pai verdadeiro era um jovem da vila que ela estava tentando proteger.

Os pais imediatamente foram a Hakuin, constrangidos, para ver se ele poderia devolver a guarda do bebê. Com profusas desculpas eles explicaram o que tinha acontecido.

"É mesmo?" disse Hakuin enquanto devolvia a criança.

quarta-feira, 21 de fevereiro de 2007

O ladrão que se tornou um discípulo

Uma noite quando Shichiri Kojun estava recitando sutras um ladrão com uma espada entrou em seu zendo, exigindo seu dinheiro ou a sua vida.

Shichiri disse-lhe:

"Não me perturbe. Você pode encontrar o dinheiro naquela gaveta." E retomou sua recitação.

Um pouco depois ele parou de novo e disse ao ladrão:

"Não pegue tudo. Eu preciso de alguma soma para pagar os impostos amanhã."

O intruso pegou a maior parte do dinheiro e principiou a sair.

"Agradeça à pessoa quando você recebe um presente," Shichiri acrescentou. O homem lhe agradeceu, meio confuso, e fugiu.

Poucos dias depois o indivíduo foi preso e confessou, entre outras coisas, a ofensa contra Shichiri. Quando Shichiri foi chamado como testemunha ele disse:

"Este homem não é ladrão, ao menos tanto quanto me diz respeito. Eu lhe dei o dinheiro e ele inclusive me agradeceu por isso."

Após o homem ter cumprido sua pena, ele foi a Shichiri e tornou-se um de seus discípulos

segunda-feira, 5 de fevereiro de 2007

Plena Atenção

Após dez anos de aprendizagem, Tenno atingiu o título de mestre Zen. Num dia chuvoso, ele foi visitar o famoso mestre Nan-In. Quando ele entrou no mosteiro, o mestre recebeu-o com uma questão,

"Você deixou seus tamancos e seu guarda-chuva no alpendre?"

"Sim", Tenno replicou.

"Diga-me então," o mestre continuou, "você colocou seu guarda-chuva à esquerda de seu calçado, ou à direita?"

Tenno não soube como responder ao koan, percebendo afinal que ele ainda não tinha alcançado a plena atenção. Então ele tornou-se aprendiz de Nan-In e estudou sob sua orientação por mais dez anos.

terça-feira, 16 de janeiro de 2007

Na Linha do Mar

Galo cantou
Às quatro da manhã
Céu azulou
Na linha do mar

Vou me embora desse mundo de ilusão
Quem me vê sorrir
Não há de me ver chorar

Flechas sorrateiras, cheias de veneno
Querem atingir o meu coração
Mas o meu amor, sempre tão sereno
Serve de escudo pra qualquer ingratidão


- Autor: Paulinho da Viola

terça-feira, 2 de janeiro de 2007

Onde está sua mente?

Finalmente, após muitos sofrimentos, Shang Kwang foi aceito por Bodhidharma como seu discípulo. O jovem então perguntou ao mestre:

"Eu não tenho paz de espírito. Gostaria de pedir, Senhor, que pacificasse minha mente."

"Ponha sua mente aqui na minha frente e eu a pacificarei!" replicou Bodhidharma.

"Mas... é impossível que eu faça isso!" afirmou Shang Kwang.

"Então já pacifiquei a sua mente.", conclui o sábio.