A VIDA DO BUDA EM VERSOS
( J. Palmeira Guimarães - Paraíba, 1977 )
A História que vou contar,
aconteceu realmente
há quase 26 séculos
em um país do oriente.
se alguém quiser comprovar
é bastante consultar
os livros de antigamente!
É a vida do Senhor Buda,
nascido um príncipe hindu,
seu pai - era Suddhodana,
rei de Kapilavastu,
sua mãe – a rainha Maya,
seu reinado – entre o Himalaya
e a montanha Sumeru.
É uma narrativa verídica,
mas fantástica, também.
fala de reis, de rainhas,
de amor, ódio, mal e bem.
tem santos, heróis, vilões,
aventuras e emoções
- como toda história tem.
Ela é simultâneamente
história humana e sagrada,
tem seus instantes dramáticos
como numa luta armada,
mas tem lances de ternura,
de alegria e de doçura,
como nos contos de fada.
É um episódio profano
e, ao mesmo tempo, divino
capaz de empolgar o santo
e comover o assassino,
terno – como uma canção,
doce – como uma oração
vibrante – que nem um hino.
É capaz de aproximar
todos os filhos de Deus:
evangélicos, católicos,
muçulmanos ou judeus
e até os mais renitentes
que se proclamam descrentes,
pensando que são ateus...
Vamos direto ao assunto
que o seu tempo é precioso
e eu sei que, nessas alturas,
você já está curioso
pela história prometida,
e história muito comprida
é coisa de mentiroso.
540 anos
Antes da Era Cristã,
pleno jardim do palácio,
onze horas da manhã.
A bela rainha Maya
contempla os véus do Himalaya
recostada em seu divã.
Havia se completado
o tempo da gestação.
A rainha, embevecida
na sua contemplação,
nem viu que a tarde chegara
e, de seu ventre brotara
o nobre filho varão!
O parto ocorreu sem
dor
como benção do Infinito.
A mãe só se apercebeu
quando ouviu do filho o grito
Nasceu perfeito e, ademais,
trouxe todos os sinais
do nascimento bendito.
Em quatro palanques de ouro
chegara o príncipe nu
trazido por quatro arcanjos
da montanha Sumeru,
em cujos cumes residem
divindades que presidem
a vida do povo hindu.
A notícia se espalhou
por toda a terra indiana,
o povo foi convidado
e o grande Rei Suddhodana
festejou com pompa e brilho
o nascimento do filho
durante toda a semana.
Acorreram visitantes
da Índia e de outros países,
trazendo ricos presentes
dos mais diversos matizes,
enquanto os pais da criança
riam, cheios de esperança,
imensamente felizes.
No meio dos convidados
o rei notou um asceta,
sentado, pernas cruzadas,
mãos postas, coluna ereta,
e viu naquela figura
a correção e a postura
de um verdadeiro profeta.
Sentindo um impulso estranho
- misto de ternura e espanto –
o rei pegou o menino,
desnudou-o de seu manto
e pediu para a rainha
conduzir a criancinha
aos pés daquele homem santo.
O ancião que, impassível,
fitava o céu, distraído,
ao ver o príncipe herdeiro
levantou-se comovido
fazendo, em meio a orações,
oito genuflexões
saudando o recém-nascido.
Depois, pediu que a rainha
pusesse o filho no colo
e cumpriu, em reverência,
um estranho protocolo:
Curvado, as mãos estendidas,
por oito vezes seguidas
tocou a testa no solo.
Mais tarde, o asceta
explicou
ante a surpresa dos pais
que viu naquela criança
os 112 sinais
de sua origem divina,
previu toda a sua sina
e ainda lhes disse mais:
- “ O vosso Divino filho
será muito mais do que um rei,
reformará o universo,
trará uma nova Lei
e eu não estarei presente,
porque muito brevemente
deste mundo partirei!
“ Quanto a vós, nobre senhora,
cumpristes Lei Soberana
dando á luz a essa flor
de nossa árvore humana,
vossa missão foi cumprida
e deixarás esta vida
dentro de uma semana”...
O olhar do sábio parado,
sereno como uma praia
pousou aos pés do menino,
fitou a rainha Maya
e o ancião diluiu-se,
desapareceu, fundiu-se
entre as neves do Himalaia.
Tudo que o santo previra
no seu tempo aconteceu.
se o rei tinha alguma dúvida
esta desapareceu
quando, no sétimo dia,
depois desta profecia
sua esposa faleceu!
No outro dia, após o sonho,
convocou-se o Ministério,
o rei falou aos seus pares
sem revelar o mistério,
transmitindo ordens expressas
para chamarem às pressas
os oráculos do império.
O rei conduziu os sábios
para um salão reservado,
depois, chamou a esposa
que se sentou ao seu lado,
e ela fez todo o relato
sem omitir nenhum fato,
tudo o que havia sonhado.
O que mais surpreendeu
foi a atitude dos sábios:
ouviram tudo tranquilos,
com um sorriso nos lábios
como se o que ela dissesse
há muito tempo estivesse
escrito em seus alfarrábios
Todo o salão era um
túmulo
não se ouvia o menor som.
Nisto, o ancião mais grisalho
falou num suave tom,
com ar sereno e risonho:
"Sol em Câncer ... este sonho,
vosso sonho é muito bom ...
"Vós, veneranda rainha,
dareis à luz um menino
de ciência maravilhosa,
com um mandato Divino
que, se quiser, num segundo
poderá salvar o mundo
e transformar-lhe o destino!"
Por isto, o rei Suddhodana
andava tão preocupado.
Ele não queria um santo,
profeta ou iluminado,
mas um simples sucessor
para seu continuador
no comando do reinado.
E assim cada dia o rei
andava mais grave e sério
pensando nas profecias
e em todo aquele mistério,
tramando um plano ladino
para fazer o menino
se interessar pelo Império!
Deu ordens pra que
Siddarta
desde a sua tenra infância
vivesse um mundo de sonhos
sendo mantido à distância
da pobreza, da feiura,
da velhice, da amargura,
da dor e da ignorância.
Para manter o menino
cercado de tais cuidados,
mandou vir de toda parte
os jogos mais delicados,
as iguarias mais finas,
as mais belas dançarinas
e os mais saudáveis criados.
Quando Siddarta atingiu
os oito anos de idade,
o rei chamou seus ministros
e falou com seriedade:
"Preciso de um instrutor
que torne o meu sucessor
um monarca de verdade.”
"Quero um mestre que lhe ensine
a governar e a viver,
as Leis, os jogos, as artes,
os segredos do poder,
tudo o que a Ciência abarca
e que um futuro monarca
necessita de saber!
“Procurem por toda
parte
o sábio mais instruído,
o mestre mais respeitado,
o Guru mais entendido.
Pensem o quanto quiserem
e falem quando tiverem
o problema resolvido.”
O Conselho de Ministros
acolheu do Rei o plano
e, por unanimidade,
sugeriu ao soberano
um nome considerado
o sábio mais respeitado
do territorio indiano:
- Só Visvamitra – disseram –
preenche o que desejais
e pode ensinar ao príncipe
todas as artes manuais,
as Ciências, as Escrituras,
as diferentes culturas
Idiomas e tudo o mais".
O rei aprovou o nome
Visvamitra foi chamado,
compareceu ao palácio
confessou-se muito honrado
e disse ao rei Suddhodana:
"Já na próxima semana
começa o aprendizado".
Para a surpresa do
mestre
Siddarta era obediente,
humilde, falava pouco,
era alegre, sorridente,
respeitador, atencioso,
e, o que era mais espantoso,
um sábio, embora inocente!
O menino já sabia
ler, escrever, calcular,
Ciências, Religiões,
a arte de comandar,
era um perfeito doutor
em tudo que o professor
pretendia lhe ensinar.
Visvamitra pôs no quadro
difícil sentença escrita:
era uma estrofe sagrada,
profunda e muito erudita
tirada aos livros sagrados,
destinada a iniciados
ou gente muito erudita.
Pela complexidade
da sentença que escolheu
Visvamitra estava crente
no raciocínio seu
que aquele jovem rapaz
jamais seria capaz
de ler o que ele escreveu.
Siddarta olhou para o quadro,
sorriu respeitosamente
e, com surpresa do mestre,
leu tudo corretamente
e ainda pediu licença
pra interpretar a sentença
pormenorisadameute.
Com a permissão do mestre
Siddarta analisou tudo:
a prece, as suas origens,
seu sentindo e o conteúdo,
enquanto o mestre o escutava
e simplesmente aprovava,
surpreso, espantado, mudo.
E, como se não
bastassem,
essas provas eloquentes
ou como se alguém pedisse
demonstrações mais patentes,
interpretou a oração
à luz da Religião
em dez línguas diferentes!
Mostrou, com toda
humildade,
que dominava a Gramática,
Geografia, História, Música,
a Física e a Matemática
e, o que era mais surpreendente,
conhecia intimamente
a ciência da vida prática.
Entendia tudo de Arte,
lia os arcanos e as sortes,
lia a linguagem dos astros,
sabia tudo de Esportes
e, na arte de combater,
era capaz de vencer
aos lutadores mais fortes!
Discorria facilmente
sobre Pintura e Beleza,
dominava a espada o arco
com invejável destreza,
era um perito em amor
e um grande conhecedor
das coisas da Natureza!
Diante disto,
Visvamitra
— mestre entre os mestres hindus —
prostrou-se aos pés do menino
e disse: "TU ÉS A LUZ,
NÃO SEREI MAIS TEU GURU,
NÃO SOU TEU MESTRE E SIM TU,
POIS ÉS GURU DOS GURUS"!...
E assim a todos os mestres
Siddarta rendia preito
de carinho, de amizade,
de gratidão e respeito,
mas em matéria de estudo
ele conhecia tudo,
já era um mestre perfeito.
Participava de jogos,
brincadeiras, distração.
Geralmente, era o primeiro
em qualquer competição,
mas o que mais lhe agradava
era quando se isolava
sozinho, em meditação...
Tratava do mesmo jeito
príncipes e serviçais,
via a todas as pessoas
como se fossem iguais,
respeitava a todo mundo
e tinha um amor profundo
pelas plantas e animais.
Nas competições de
caça
que era obrigado a fazer
deixava escapar as aves
para não vê-las morrer
ou pra não tirar do amigo
que competia consigo
a alegria de vencer.
Embora considerado
cavaleiro sem igual,
perdia corridas ganhas
simulando passar mal,
para poupar energia
ao cavalo em que corria
e não forçar o animal!
Certa feita um de seus
primos,
que era o príncipe Dewatta,
atirou num cisne branco
que passava pela mata,
acertou-o em pleno peito
e ficou bem satisfeito,
rindo de sua "bravata".
Siddarta que assistiu tudo
sentado junto à lagoa,
quando viu tombar a ave
saiu correndo, apanhou-a,
tirou- lhe a flecha do peito
e a tratou com tanto jeito
que ela logo ficou boa.
Dewata exigiu que o cisne
fosse a ele devolvido,
porque segundo o costume
há muito estabelecido
e já por todos aceito
o atirador tem direito
a qualquer bicho abatido.
Mas Siddarta
recusou-se
e lhe disse: "Não, senhor,
o cisne agora está vivo
e seja lá como for
será minha propriedade
por direito de piedade
e onipotència do amor.''
Por incrível que pareça
esse caso tão banal
foi levado à decisão
do Conselho Imperial
que discutiu todo um dia
pra decidir quem teria
direito ao cisne, afinal.
Apôs muito discussão
e opiniões divergentes,
quando os ministros da corte
já estavam impacientes,
um vulto em forma de Luz,
veio, envolto num capuz
e falou para os presentes:
"— SE A VIDA
POSSUI VALOR
CABE A TODOS PRESERVÁ-LA.
NO CASO, UM SALVOU A AVE
E O OUTRO TENTOU MATÁ-LA.
A AVE SERÁ MANTIDA
COM QUEM LHE SALVOU A VIDA
E NÃO COM QUEM QUIS TIRÁ-LA"!...
Com essa sentença, o vulto
encerrou todo o litígio.
O rei quis dar lhe um presente,
como prova de prestígio,
buscou o desconhecido,
mas ele havia sumido
sem deixar qualquer vestígio!
Siddarta beijou o cisne
como numa despedida,
depois, alçou-o ao espaço
em suave arremetida.
A ave partiu em paz,
agradecendo ao rapaz
por ter salvo a sua vida
Dewatta se desculpou
por ter causado a discórdia,
os dois primos se abraçaram
tudo voltou à concórdia,
Siddarta entrou no Budato
cumprindo o primeiro ato
de pura misericórdia.
.
Para ele, esse incidente
teve um profundo valor:
foi sua primeira chance
de praticar o amor
e a primeira vez, por certo,
que ele poude ver de perto
na dor do pássaro — A DOR!
.
O amor e a dor se tornaram
a partir daquele dia
sentimentos sobre os quais
Siddarta meditaria
e, em época futura,
serviriam de estrutura
à sua Filosofia...
A estratégia do rei
consistia em convidar
Siddarta para um passeio
em que pudesse mostrar
toda a extensão do reinado
e fazê-lo interessado
nas terras que iria herdar...
.
Pensava que quando o filho
visse a vastidão do império
passasse a encarar o trono
como um assunto mais sério
e perdesse o interesse
por meditações e prece
e todo aquele mistério.
.
O rei mandou preparar
a mais bonita carruagem
e deu ordens pessoalmente
aos súditos e à vassalagem
para que a comitiva
fosse saudada com VIVA
durante toda a passagem.
Feitos os
preparativos,
aguardou com esperteza
um dia de primavera
cheio de sol e beleza,
de modo que o itinerário
tivesse como cenário
o esplendor da Natureza.
.
Ao receber o convite,
Siddarta que só vivia
trancado em seus aposentos
e raramente saía,
beijou o pai com ternura
e partiu para a aventura
na inocência da alegria.
.
Havia um clima de festas
o reino todo enfeitado,
o povo aplaudia o príncipe,
o rei estava empolgado
e sorria satisfeito,
pois tudo estava do jeito
que ele havia planejado.
Siddarta se deleitava
contemplando a Natureza:
rios, terras, campos, flores
e toda aquela beleza,
mas enquanto contemplava
seu coração mergulhava
numa profunda tristeza!
.
É que o jovem via as coisas
além de sua aparência,
procurando penetrá-las
no fundo de sua essência,
vendo com outra visão:
olhava com o coração,
via com a consciência.
.
No rosto dos camponeses
via um riso encomendado,
nas suas mãos calejadas
e no seu corpo alquebrado
Siddarta enxergava a dor
de seu irmão lavrador
pobre, oprimido e explorado .
.
Nas mulheres desdentadas,
magras do pouco comer
— que punham as mãos na boca
para o sorriso esconder —
via legiões suicidas
que davam as próprias vidas
para o reinado crescer...
.
Nas mãos magras das crianças,
inocentes, puras, calmas,
que, à passagem do cortejo,
tremiam, batendo palmas,
via protestos, reclamos,
clamando aos céus por seus amos,
rogando por suas almas!
Via o pescoço dos bois
na canga, arando arrozais.
Viu a exploração reinando
sobre filhos, mães e pais,
alimentando os tiranos,
escravizando os humanos
e humilhando os animais! .
.
.
Siddarta pediu ao rei
pra interromper a excursão
avistou uma mangueira,
sentou-se à sombra, no chão
e ficou ali, parado,
totalmente mergulhado
em longa meditação.
.
O rei ainda o esperou
durante mais de uma hora,
depois, impacientou-se
devido a grande demora,
recomendou-o aos vassalos,
atrelou os seus cavalos,
despediu-se e foi embora.
.
Ali, Siddarta bebeu
Sabedoria na fonte.
Vieram anjos do espaço
iluminaram-lhe a fronte
e ele só se levantou
depois que o sol se ocultou
lá nos confins do horizonte.
.
Durante a meditação
um fato estranho ocorreu.
Se foi acaso ou milagre
ninguém garante — nem eu —:
durante uma tarde inteira
não deu sol sob a mangueira,
a sombra não se mexeu!...
.
Assim, o rei Suddbodana
Viu se frustarem os planos
de interessar o menino
pelos tesouros profanos,
enquanto o tempo passava
e Buda se aproximava
de atingir dezoito anos.
.
Foi quando o rei teve a idéia
de apelar para a emoção.
Já que o filho não mostrava
pelo reinado ambição,
planejou então casá-lo
e, quem sabe, conquistá-lo
através do coração.
.
Convocou de novo a Corte
e confessou-se assustado
pois, conforme as profecias,
Buda era um predestinado
e abandonaria o Império
a não ser que algo mais sério
o prendesse no reinado.
“ — Siddarta já está
na idade
(disse o rei com sutileza)
em que não há quem resista
aos encantos, à beleza
de um rosto jovem, formoso
e ao sorriso gracioso
de uma bonita princesa...
.
"Por isto, estou pretendendo,
como manda a tradição,
escolher entre as donzelas
de toda nossa nação,
uma que seja capaz
de provocar no rapaz
a mais violenta paixão".
.
Os ministros, como sempre,
acharam que o soberano
tinha pensado um esquema
"genial" e "sobrehumano",
Só um deles — o mais velho —
pediu licença ao Conselho
para completar o plano.
.
— "Eu sugiro a Vossa Alteza
que convoque esta semana
as mais prendadas donzelas
de toda a terra indiana,
e Siddarta escolherá
dentre elas a que será
a futura soberana"
.
O rei achou magnífica
a idéia do conselheiro
e, após o endosso real
ao plano do cavalheiro,
os ministros concordaram
e todos cumprimentaram
seu "ilustre companheiro"...
.
Espalharam-se editais
divulgando o grande dia
em que o príncipe Siddarta,
numa festa, escolheria
dentre as princesas mais belas
a mais prendada entre elas,
com quem depois casaria.
.
No dia do grande evento
os jardins palacianos
regurgitavam de moças
em seus trajos indianos,
cada uma mais bonita
aguardando a hora bendita
de concretizar seus planos.
.
O rei tinha convidado
a plebe e a realeza,
foi a festa mais bonita
que se viu na redondeza.
Nunca em Kapilavastu
nem no território hindu
reuniu-se tanta beleza.
.
De seu palanque real,
Siddarta a tudo assistia,
cumprimentava as princesas
com natural cortesia,
a todas dava um presente,
sorria amistosamente
e o desfile prosseguia.
.
Dezenas de senhoritas
já haviam desfilado
sem que o jovem se mostrasse
por nenhuma interessado.
Eram todas muito belas,
porém por nenhuma delas
sentira-se apaixonado.
.
Quando a última princesa
pisou sobre a passarela
foi logo reconhecida
como de fato a mais bela,
e o príncipe estremeceu
tão logo a reconheceu
e se dirigiu a ela.
.
Todos queriam saber
Quem era essa jóia rara
que impressionou a Siddarta
de maneira assim tão clara.
Esclareceu-se afinal:
era de sangue real,
seu nome era Yasodhara.
.
Veio a se saber, mais tarde,
relendo os livros sagrados,
que Yasodhara e Siddarta
há muito estavam ligados
por laços superiores
e, em vidas anteriores,
já tinham sido casados.
Naquele instante,
porém,
só ela e ele sabiam.
Por isto, os dois se entreolharam,
se abraçavam, se sorriam,
os demais olhavam tudo
cheios de um espanto mudo,
porém nada compreendiam.
.
Quando terminou a festa
que foi um deslumbramento
Suddhodana não cabia
em si, de contentamento,
e foi ao rei Suprabuda
pedir pro seu filho, Buda,
Yasodhara em casamento.
.
Suprabuda convocou
a Corte, amigos, parentes,
e recebeu Suddhodana
com honras e com presentes,
mas mostrou a Sua Alteza
que Yasodhara — a princesa —
já tinha três pretendentes.
.
Eram três príncipes jovens,
famosos no império inteiro:
Ardjuna — um mestre da esgrima,
Dewadatta— um grande arqueiro,
e Ananda, o mais respeitado,
por todos considerado,
como exímio cavaleiro!
.
Se Siddarta pretendesse
Yasodhara por consorte
teria que demonstrar
ser de todos o mais forte
e em três duelos formais
derrotar seus três rivais,
cada um no seu esporte!
.
Suddhodana agradeceu,
mas regressou ao castelo
bastante desanimado,
achando aquilo um flagelo
pensando que o seu rapaz
que era um amante da paz
não aceitasse o duelo.
.
Quando explicou tudo ao filho
seu mau humor se desfez,
Siddarta disse ao seu pai
marque a data de uma vez,
embora eu deteste luta,
travarei essa disputa,
tentarei vencer os três.
.
No dia, tudo ocorreu
como em casos semelhantes:
os suspiros da princesa,
os lances emocionantes,
Siddarta foi quem ganhou
e o povo comemorou
entre aplausos delirantes...
Não vou descrever;
aqui
o baile monumental,
nem tampouco os rituais
ou o cerimonial
que deram ao casamento
um tom de acontecimento
de dimensão nacional.
.
Para o casal residir
o rei mandou levantar
ao lado do seu palácio
mansão espetacular
com jardins, piscinas, grutas,
cascatas, flores e frutas,
em meio a um grande pomar.
.
Por fora era um paraíso,
por dentro era um santuário.
Os mais suntuosos tapetes,
riquíssimo mobiliário,
tudo do mais alto nível,
de um bom gosto indiscutível
e um conforto extraordinário.
.
A mansão toda era um sonho,
mas o quarto nupcial
foi decorado a capricho
para envolver o casal
na atmosfera poética
de uma prisão magnética
própria para o. amor real.
.
Naquele mundo de luzes,
encantamento e poesia
dias e noites passavam
como se fossem o dia
entre o afeto e o carinho
o amor construiu seu ninho
e a paz sua moradia.
.
Mas... tudo tem face e dorso,
todo verso tem reverso
e, para não ser perfeita
a paz daquele universo
o rei tinha concebido
e fez ser obedecido
um plano muito perverso:
.
Mandou fazer três portões
que isolavam a mansão,
em cada portão, um guarda
com rigorosa instrução
pra vigiar noite e dia,
ninguém entrava ou saía
sem ter do rei permissão.
.
Apesar das precauções
e de todo o isolamento,
Siddarta ouvia mensagens
trazidas na voz do vento
e, sem sair da mansão,
voava pela amplidão
nas asas do pensamento...
Certa noite, ele
acordou
durante um sonho profundo
e ouviu uma voz dizer-lhe:
"SOU O VENTO VAGABUNDO,
VEM COMIGO. POR FAVOR,
DEIXA O TEU NINHO DE AMOR,
VAMOS VER A DOR DO MUNDO!
.
"OUVE, EU SOU A VOZ DO VENTO
QUE VIVE SEMPRE A SOPRAR,
SUSPIRANDO POR REPOUSO,
MAS SEM NUNCA REPOUSAR.
A VIDA É TAMBÉM ASSIM:
UMA TORMENTA SEM FIM,
UM SOLUÇO SEM CESSAR.
.
"QUE PRAZER PODES SENTIR
NESSA CADEIA DE AMOR
TU QUE FOSTE O ESCOLHIDO
PARA SER O SALVADOR?!
COMO FICAR PRISIONEIRO
DE UM SONHO QUE É PASSAGEIRO
COMO TUDO, EXCETO A DOR?
.
"DESPERTA, FILHO DE MAYA,
SAI DO TEU ESQUECIMENTO,
VÊ QUE O CAMINHO DA VIDA
É IGUALZINHO AO DO VENTO:
SOLUÇOS, SUSPIROS, LUTA,
GUERRAS, TORMENTOS, DISPUTA,
MISÉRIA, DOR, SOFRIMENTO!
.
"ENQUANTO DORMES TRANQUILO,
PRESO A SUPOSTAS RAÍZES.
HÁ TRISTEZA EM TODA PARTE,
GUERRAS EM DIVERSOS PAÍSES,
FOME EM TODOS OS LUGARES,
DOENÇA EM TODOS OS LARES,
MILHÕES DE HOMENS INFELIZES!
.
"TUA HORA SE APROXIMA!
ABANDONA ESSA PRISÃO,
RENUNCIA A HIERARQUIA,
ROMPE OS GRILHÕES DA ILUSÃO,
VAI DESCOBRIR A VERDADE
E DAR PÁRA A HUMANIDADE
A PAZ E A LIBERTAÇÃO!
.
COMO PODES DESCANSAR
ENTRE APARENTES PODERES
E TE DEIXAR SEDUZIR
POR ESSES FALSOS PRAZERES,
TU QUE VIESTE PRA SALVAR
E, PELO AMOR, LIBERTAR
DA DOR A TODOS OS SERES?!"
.
Quando o vento silenciou
Siddarta teve a certeza
de sua nobre missão
e, com toda a sutileza,
começou a imaginar
um modo de não magoar
o coração da princesa.
Sempre que os dois
conversavam
Ele lhe dava a entender
que embora a amasse bastante
era bom ela saber
que ele já fora avisado
de que seria chamado
para um mais alto dever!
.
Apesar de ele falar
com todo jeito e cuidado
e fazê-lo em pleno leito,
no momento apropriado,
Yasodhara chorou tanto
que inundou com seu pranto
o peito do bem-amado.
.
Siddarta acordou-se um dia
decidido a caminhar,
chamou seu criado — Channa —
mandou-o ao rei avisar
que queria ir à cidade,
ver gente, andar à vontade,
respirar um outro ar.
.
O rei pensou em negar,
mas sentiu que não devia,
concordou com o passeio
embora sem alegria.
Deu instruções ao criado
e tudo foi combinado
para a manhã do outro dia.
.
Antes, mandou que enfeitassem
os caminhos e a cidade.
para que o filho só visse
beleza e felicidade
e não pudesse encontrar
nada capaz de magoar
sua sensibilidade.
.
Recolheram-se mendigos,
pobres, cegos, aleijados,
as ruas foram varridas.
os prédios todos lavados.
Doentes, feridos, leprosos
e até os homens idosos
foram todos retirados.
.
Siddarta saiu com Channa
no outro dia bem cedinho,
aplaudido pelo povo
durante todo o caminho.
De todas as direções
vinham manifestações
de entusiasmo e carinho.
.
As ordens de Suddhodana
eram sempre respeitadas:
as casas estavam limpas,
as avenidas lavadas,
as pessoas bem vestidas,
as ruas todas varridas;
e as praças embandeiradas.
Tudo transcorria bem,
Siddarta estava contente
quando, de forma imprevista,
surgiu bem na sua frente
um mendigo esfarrapado,
velho roto, esclerosado,
- um arremedo de gente!
.
O velho saiu aos gritos
pulando de entre a folhagem
e prostrou-se em.plena estrada.
na frente da carruagem,
chamando a atenção de Buda,
implorando a sua ajuda,
interrompendo a passagem.
.
Siddarta desceu do carro,
conversou com o ancião,
contemplou o seu estado
com profunda compaixão,
deu-lhe o dinheiro que tinha
e, como a noite já vinha,
regressou para a mansão.
.
Trancou-se em seus aposentos
chamou Yasodhara e disse
para não ser perturbado
e, sem que ninguém o visse,
meditou por vários dias
sobre a dor, as agonias
e a Solidão da Velhice.
.
Saiu da meditação
bastante transfigurado,
não se alimentava bem,
nada era de seu agrado.
Seu desejo era partir,
desaparecer, sumir,
abandonar o reinado!
.
Quando o rei soube de tudo
através de um seu criado,
ficou bastante abatido,
sentiu-se desmascarado.
Sonhava todos os dias
pensando nas profecias,
cada vez mais preocupado
.
Siddarta, então, disse ao rei:
"Abra os portões, um por um,
quero sair amanhã
como um cidadão comum,
sem pompas, sem carruagem,
sem guardas, sem vassalagem
e sem aviso nenhum."
.
Embora contra a vontade
o rei lhe deu permissão,
Siddarta saiu com Channa
misturou-se à multidão,
conversou com lavradores,
ladrões, sábios, mercadores,
como homem, como irmão.
Sem as insígnias reais
percorreu toda a cidade
falou com pobres e ricos
discutiu com a mocidade.
Quanto mais se aprofundava
mais sentia que ansiava
por conhecer a Verdade
.
Foi a templos, hospitais,
prisões, asilos, escolas,
viu milhares de mendigos
exibindo-lhe as sacolas,
viu a dor e a ignorância
e chorou de ver a infância
faminta, pedindo esmolas.
.
Ao se afastar das muralhas
da cidade, rumo ao Norte,
Siddarta ia deparar
uma emoção bem mais forte:
viu, sem poder fazer nada,
a luta desesperada
entre um moribundo e a morte
.
Channa e o príncipe andavam
quando surgiu, no caminho,
todo coberto de chagas
um camponês bem velhinho.
A peste o tinha atacado
e o povo o tinha largado
pra morrer ali, sozinho.
.
Quase morto, já sem forças,
o ancião suplicava:
queria morrer em casa
onde a família o esperava.
Só encontrava indiferença,
porque a sua doença,
além do mais, contagiava
.
Ante o protesto de todos
inclusive seu criado,
Siddarta pegou o velho,
pôs nos ombros com cuidado,
levou-o à casa, correndo.
O velho acabou morrendo,
mas antes foi confortado,
.
Siddarta viu, transtornado,
sem nada poder fazer,
a luta do homem com a morte
e a morte, por fim, vencer.
Quando tudo consumou-se
chamou Channa e retirou-se
sem nada mais querer ver.
Recolheu-se em seu
palácio
num sofrimento profundo,
meditou sobre a angústia
e a morte do moribundo,
vendo no acontecimento
a dor e o sofrimento
dos homens todos do mundo.
.
Viu que a morte torna iguais
o pobre e o potentado
e o sofrimento nivela
o analfabeto e o letrado
que a riqueza acaba em ruína
e que o próprio amor termina
na perda do ser amado!
.
Viu que o homem vem ao mundo
num grito de sofrimento,
sofre a doença, a velhice,
sofre da morte o tormento
e volta em outra existência,
para cumprir a sequência
de dor e padecimento...
.
Depois de meditar muito
chegou a uma conclusão:
não lhe era mais possível
permanecer na mansão,
resolveu que iria embora,
sair pelo mundo afora,
cumprir a sua missão!
.
Renunciou ao reinado,
hierarquia, propriedade,
esposa, fortuna, luxo,
para buscar a Verdade
e as origens da dor,
dedicar-se ao puro amor,
libertar a humanidade!
.
Chamou, então, Yasodhara
apertou-a ao coração,
explicou-lhe as razões todas
de sua resolução
disse-lhe o quanto sentia,
mas que não mais poderia
permanecer na ilusão.
.
- "VOCÊ ME TEM DE DIREITO,
MAS DE FATO NÃO ME TEM.
SAIBA QUE EU LHE AMO BASTANTE
LHE DESEJO TODO O BEM.
EU REGRESSAREI POR CERTO,
MAS SÓ VOLTAREI LIBERTO,
PARA SALVÁ-LA TAMBÉM."
.
A princesa tentou tudo
para o fazer desistir,
por fim, falou-lhe do filho
dos dois, que estava por vir.
Siddarta ouviu comovido,
mas já estava decidido
e então tratou de partir.
Todos dormiam na
Corte,
era uma noite estrelada.
Ele beijou Yasodhara
e saiu sem dizer nada,
mandando Channa — o vassalo —
preparar o seu cavalo
para aquela madrugada.
.
O criado ainda lhe disse:
— "Deixai parentes e amigos,
prazeres, riquezas, trono,
para viver com mendigos
pelas montanhas geladas,
entre as feras esfomeadas
e mil outros inimigos?!
.
"Vós que tendes a fortuna
e o privilégio do trono,
largais toda essa riqueza
para viver no abandono,
sem ter nem sequer direito
ao terno calor de um leito
nas vossas noites de sono?
.
"Pensai na angústia do rei
ao notar vossa partida,
refleti no desespero
de vossa esposa querida
que vos deu o seu amor!
E nós, teus servos, Senhor,
que será de nossa vida?!"
.
Siddarta abraçou o amigo
e, sem querer ser severo,
olhou-o dentro dos olhos
e disse num tom sincero:
"PODES FICAR DESCANSADO,
TUDO ISTO JÁ FOI PENSADO,
É ISTO MESMO QUE EU QUERO.
.
"O AMOR QUE, POR COMODISMO,
É CAPAZ DE SE PRENDER
ÀS CRIATURAS A QUE AMA
PRA DELAS TIRAR PRAZER,
É UM SENTIMENTO EGOÍSTA,
FALSO, IMPURO, EXCLUSIVISTA,
QUE DEVEMOS COMBATER!
.
CULTIVAR UM TAL AMOR
É SIMPLES HIPOCRISIA.
AMO MEU PAI E A PRINCESA
MAS DO QUE A MINHA ALEGRIA
JUSTAMENTE POR AMÁ-LOS
VOU PARTIR, PARA SALVA LOS,
QUANDO EU VOLTAR ALGUM DIA".
.
O criado, banhado em pranto,
mostrava o quanto sofria.
Siddarta então lhe falou:
"PREPARA OUTRA MONTARIA,
JÁ QUE ÉS TÃO LEAL AMIGO,
CAMINHA UM POUCO COMIGO,
VEM ME FAZER COMPANHIA".
Montado no seu cavalo,
deu uma última olhada,
despediu-se dos jardins
de sua prisão dourada,
fazendo um aceno mudo,
num gesto de quem diz tudo
sem precisar falar nada.
.
Fitou o céu estrelado,
as mãos sobre o coração,
saudou a lua e as estrelas
como a pedir proteção.
Lá longe, os astros brilharam,
num sinal de que aprovaram
a sua resolução...
.
Channa seguia ao seu lado
sem entender o mistério.
Siddarta bastante alegre
o criado calado e sério.
Cavalgaram noite afora
até que, ao romper da aurora,
chegaram no fim do império.
.
Ali mesmo na fronteira
do que fora o seu reinado,
Buda desceu do cavalo,
despediu-se do criado
e lhe pediu, com amor,
um derradeiro favor:
levar ao rei um recado.
.
Despiu-se de sua túnica
e do cinturão real,
cortou toda a cabeleira
com a espada imperial
e recomendou a Channa
que entregasse a Suddhodana
com seu amor filial:
.
“ - LEVA TODAS ESSAS COISAS
DE QUE NÃO PRECISO MAIS,
MEU CAVALO, MINHAS JÓIAS,
E AS MINHAS VESTES REAIS,
DIZ À SUA MAJESTADE
QUE EU VIREI COM A VERDADE
OU NÃO VOLTAREI JAMAIS! “
Em torno de Rajagriha
- terras do rei Bimbisara
Existem cinco montanhas,
São: Bipula, Baibhara,
Tapovan, Sailagiri
E, ao leste, Ratnagiri.
Nesta, Siddharta ficara.
.
No dorso dessa montanha
de penhascos escarpados
descobriu uma caverna
onde pôs seus pés sagrados,
fez muitas meditações
entre tórridos verões
e crepúsculos gelados.
.
Passava os dias e as noites
em meditação tranqüila
possuía o manto amarelo,
a marmita e uma mochila.
Quando a comida acabava
ele vinha e mendigava
nos arredores da vila.
.
Brincava com as crianças,
conversava alguns momentos,
retribuía as esmolas
com mil agradecimentos,
voltava ao seu santuário,
na caverna, solitário,
entregue aos seus pensamentos.
.
Geralmente ao meio dia
sentava-se a meditar,
ficava até meia noite
em vigília, sem parar,
levantava, olhava a lua,
deitava na relva nua
até o sol acordar.
.
Quando a aurora começava
a despontar no horizonte,
Siddharta saudava o sol,
descia correndo o monte,
até chegar ao baixio,
tomava banho de rio
e bebia água da fonte.
.
Junto às montanhas viviam
uns estranhos ermitões,
faquires fanatizados
que, entre horríveis contorsões,
seu próprio corpo açoitavam
e assim se auto-mutilavam
com mil mortificações.
.
Certo dia, o Senhor Buda
tomado de compaixão,
foi ao chefe dos faquires
e quis saber a razão
daquela exibição fútil,
daquele flagelo inútil,
e ouviu esta explicação:
"Segundo o que
está escrito
em nosso livro sagrado,
quem mortifica seu corpo
até ficar mutilado
e encontra, na dor, a morte,
modifica a sua sorte
e se livra do pecado".
.
Buda, então, lhe replicou:
"VÊS ESSA NUVEM, IRMÃO?
VEM DO MAR FEITO DE RÍOS,
VIRA GOTA, VOLTA AO CHÃO,
SERÁ RIO, SERÁ MAR,
E TORNARÁ A VOLTAR
AO SEIO DA CRIAÇÃO ...
.
VÊ, POIS, MEU CARO ERMITÃO,
QUE O QUE É SEMPRE SERÁ...
ESSA MORTIFICAÇÃO
EM NADA TE MUDARÁ.
E AGORA PEÇO QUE FALES:
PORQUE JUNTAR TANTOS MALES
A VIDA QUE JÁ É MÁ"?!
.
"NOSSO CORPO É NOSSO TEMPLO
QUE DEVE SER PRESERVADO,
MORADA DE NOSSA ALMA
E SEU REFUGIO SAGRADO
POR ONDE OLHAMOS P'RA FORA.
COMO AGUARDAMOS A AURORA,
SE O CORPO FOR MUTILADO?!"
.
O velho ermitão lhe disse:
"Poupai, pois, o corpo vosso.
Eu já escolhi meu caminho,
mudá-lo agora não posso.
Deixai que eu siga sozinho,
segui o vosso caminho,
nós seguiremos o nosso".
.
Buda voltou à caverna
com mais esse ensinamento:
cada homem faz de sua vida
sua glória ou seu tormento,
e escreve a própria sentença
conforme o modo que pensa
e o grau de discernimento!
.
Depois, em meditação,
Buda pode perceber
este estranho paradoxo:
o desejo de viver
faz do homem um suicida,
ou seja, é o apego à vida
que faz o homem morrer.
.
Era o fio-da-meada
esta nova conclusão,
querendo penetrar mais
no fundo dessa questão,
recolheu se novamente,
voltou-se para o nascente
e entrou em contemplação.
Agora, se contemplava,
já não meditava mais,
totalmente abstraído
dos sentidos materiais,
liberto das sensações,
dos sonhos, das emoções,
livre das ondas mentais...
.
Muitas vezes se deixava
permanecer nesse estado
dias e noites seguidos,
alheio ao mundo extasiado,
entregue a contemplação,
sem ter a menor noção
que o tempo tinha passado!
.
Um dia, Ele caminhava
na planície, após o banho,
viu uma nuvem de pó
que acompanhava um rebanho
seguido de seus pastores,
e escutou uns estertores,
um certo balido estranho.
.
Seguiu, de perto, as ovelhas,
apurou bastante o ouvido
até poder descobrir
de onde partira o gemido,
e notou um cordeirinho
desviado do caminho,
muito causado e ferido.
.
Ao lado do borreguinho
saltitava um seu irmão,
enquanto sua mãe berrava
na mais tremenda aflição,
sofrendo pelo destino
do filhote pequenino
que agonizava no chão.
.
Diante daquele imprevisto
Buda se apiedou tanto
que pegou o cordeirinho
enrolou-o no seu manto,
pôs no colo, de mansinho,
e o conduziu com o carinho
de quem conduzisse um santo!
.
Despediu-se da montanha
e seguiu em romaria,
disposto a ir com o cordeiro
aonde o rebanho iria,
a ovelha a fazer-lhe festa,
correndo pela floresta,
dando pulos de alegria...
.
Siddarta pode sentir
nessa gratidão materna,
que valia muito mais
uma atitude fraterna
de amor e compreensão
que um ano de reclusão
no fundo de uma caverna...
Ao meio-dia os
pastores
pararam para almoçar
Os carneiros, estrupiados,
trataram de se deitar.
Siddharta olhava os caprinos
temendo por seus destinos,
e resolveu perguntar:
.
"RESPONDEI-ME IRMÃOS PASTORES,
ONDE IDES E ONDE LEVAIS,
EM MEIO AO SOL INCLEMENTE
ESSES POBRES ANIMAIS
NESSES CAMINHOS POEIRENTOS?
VEDE, ELES ESTÃO SEDENTOS
E JÁ NÃO SUPORTAM MAIS!"
.
— "O nosso rei, Bimbisara
mandou-nos arrebanhar
100 cabras e 100 carneiros
que ele irá sacrificar
hoje à noite, após o ofício,
e ofertar em sacrifício
aos deuses, no pé do altar"
.
Siddarta pensou e disse:
"NÃO TENDES CULPAS, EU SEI.
ESTAIS APENAS CUMPRINDO
AS ORDENS DE VOSSO REI.
IREI CONVOSCO À CIDADE,
VEREI SUA MAJESTADE.
EU VOS ACOMPANHAREI!"
.
Quando o sol baixou um pouco
amenizando o mormaço,
o rebanho foi tangido,
Siddarta seguiu lhe o passo,
percorreu todo o caminho
conduzindo o carneirinho
ferido, embaixo do braço.
.
Atingiram a cidade
na hora do sol se pôr.
A população inteira
quis ver o estranho pastor
em cujos olhos brilhava
uma luz que irradiava
compreensão, paz e amor.
.
Os soldados que faziam
sentinela, no portão,
olharam para Siddarta
como a uma aparição.
Não só lhe deram passagem,
mas renderam-lhe homenagem,
tal era a sua expressão.
.
As mulheres e as crianças
entraram correndo atrás
e perguntavam: “QUEM É
ESSE HOMEM, E QUE FAZ?
CAMINHA COM TANTA GRAÇA
E DEIXA POR ONDE PASSA
UMA SENSAÇÃO DE PAZ!"
Diziam uns: "É UM
PRÍNCIPE
QUE ABANDONOU SEU IMPÉRIO
E EMBRENHOU-SE NAS MONTANHAS,
DEDICADO AO MONASTÉRIO."
Outros diziam: É UM SANTO,
e tocavam no seu manto,
com ar respeitoso e sério.
.
Siddarta nada escutava
daquela especulação,
andava altivo e sereno
em plena meditação,
até que um guarda o pegou
pelo braço e o afastou
da pequena multidão.
.
Ele ainda saudou à todos
com um gesto de carinho,
acompanhou o soldado
e, quando se viu sozinho,
foi seu primeiro cuidado
buscar um canto isolado
e tratar do borreguinho.
.
Foi ele mesmo à cozinha,
conseguiu água fervida,
tratou bem do ferimento,
deu ao bicho água e comida
e o deixou-o em companhia
da ovelha que tudo via
satisfeita e agradecida.
.
Um pastor falou ao rei
que um homem desconhecido,
habitante da montanha,
tinha o rebanho seguido.
Tipo estranho — meigo e forte
e que salvara da morte
um cordeirinho ferido.
.
Na sala dos holocaustos
havia um grande bulício:
Brâmanes cantavam mantras
iniciava-se o ofício,
as ovelhas alinhadas,
de cabeças amarradas,
prontas para o sacrifício.
.
Quando o rei entrou na sala
começou o ritual:
um sacerdote, que orava,
parou, pegou o punhal
e foi para a cabra presa,
atada, inerme, indefesa,
ia sangrar o animal!
.
Nisto, Buda entra correndo
e se interpõe, circunspecto
entre o sacerdote e a cabra!
Tão grave era o seu aspecto
que o sacerdote estacou,
e o próprio rei o encarou
ante o espanto de seu séquito!
Um silêncio
indescritível
tomou conta da platéia.
Você que lê esta história
pode lazer uma idéia
do horror generalizado
que esse gesto inesperado
causou naquela assembléia!
.
O rei olhou pra Siddarta
do alto de sua nobreza
e viu, além da coragem,
da bravura e da franqueza
daquele mendigo pobre,
um porte sereno e nobre,
um toque de realeza!
.
Depois, voltou a sentar-se
já mais tranquilo e refeito.
Aí, Siddarta curvou-se,
as mãos postas frente ao peito,
pleno de serenidade,
saudou sua Majestade
com o mais profundo respeito.
.
O rei não só respondeu
do príncipe a saudação,
mais ainda lhe fez um gesto
em que dava permissão
pra que Siddarta falasse
e à assembléia explicasse
as razões da intromissão.
.
— "PERDOAI-ME MEU NOBRE REI
POR INTERROMPER O OFICJO,
MAS NÃO PUDE PRESENCIAR
O RITUAL DESDE O INÍCIO.
SEI QUE NÃO AGI DIREITO,
MAS EU NÃO TINHA OUTRO JEITO
DE EVITAR O SACRIFÍCIO.
.
"VÓS SABEIS QUE A VIDA É FRÁGIL
TODOS A PODEM TIRAR,
EMBORA NENHUM DE NÓS
TENHA O PODER DE A CRIAR.
A VIDA É UM DOM PRECIOSO,
DIVINO, MARAVILHOSO,
QUE TODOS QUEREM GOZAR...
.
"ESSES CARNEIROS NOS OLHAM
A VÓS, A MIM, AOS PASTORES,
COMO A SANTOS, COMO A DEUSES,
COMO A SERES SUPERIORES.
NO ENTANTO, QUANDO OS MATAMOS
NÓS TODOS NOS COMPORTAMOS .
COMO SERES INFERIORES!
.
"O HOMEM QUE, NA AFLIÇÃO
DE SEUS MOMENTOS CRUCIAIS,
SUPLICA AOS DEUSES CLEMÊNCIA
E JURA NÃO PECAR MAIS.
MATA ANIMAIS. IRMÃOS SEUS,
ELE - QUE É IGUAL A UM DEUS
AOS OLHOS DOS ANIMAIS!
"PROCEDEM DESSAS
OVELHAS
A LÃ E O PÊLO MACIO
QUE AQUECEM OS NOSSOS CORPOS
NAS LONGAS NOITES DE FRIO,
SEU LEITE SALVA AS CRIANÇAS,
QUE CHORAM. SEM ESPERANÇAS,
COM O ESTÔMAGO VAZIO ...
.
"NOSSO SANGUE, MAJESTADE,
TEM A MESMA COR VERMELHA
E SE NUTRE, E SE ALIMENTA
DA MESMA ETERNA CENTELHA
QUE ANIMA E NUTRE IGUALMENTE
O SANGUE PURO E INOCENTE
DE UMA CABRA OU DE UMA OVELHA!
.
"A MESMA CHISPA DIVINA
QUE HABITA O MEU CORAÇÃO
HABITA O DESSE CARNEIRO,
MEU SEMELHANTE E IRMÃO.
FAZER. UM BICHO MORRER
É O MESMO QUE INTERROMPER
O CICLO DA CREAÇÃO!...
.
"ESTÁ NOS LIVROS SAGRADOS
(E TODOS VOS O SABEIS)
A LEI DE CAUSA E EFEITO
QUE É A MAIS SÁBIA DAS LEIS
PRECONISA EM SEUS ANAIS:
REIS JÁ FORAM ANIMAIS
E ANIMAIS JÁ FORAM REIS!
.
NÃO SERÁ COM O SACRIFÍCIO
DE UM ANIMAL IMOLADO
QUE OS DEUSES-VIRÃO SALVAR
A NINGUÉM DE SEU PECADO.
UM DEUS QUE É JUSTO E CLEMENTE
NÃO PODE FICAR CONTENTE
VENDO SANGUE DERRAMADO!
.
"A JUSTIÇA UNIVERSAL
VÊ TODOS NOSSOS MOMENTOS
E É SUMAMENTE IMPLACÁVEL
EM SEUS SÁBIOS JULGAMENTOS,
PREMIANDO A MAUS E BONS
CONFORME AS SUAS AÇÕES
PALAVRAS E PENSAMENTOS!
.
"SEGUNDO ESSA LEI DIVINA
TODOS OS SERES CRIADOS
DARÃO CONTA, PESSOALMENTE,
DOS ATOS CERTOS E ERRADOS
SEJAM PUROS OU IMPUROS
E, ASSIM, TODOS OS FUTUROS
SÃO O FRUTO DOS PASSADOS!
.
"SE NINGUÉM SACRIFICASSE
ESSES POBRES INFELIZES,
SE TODOS COMESSEM FRUTOS,
GRÃOS, FOLHAS, ERVAS, RAÍZES,
NÃO HAVERIA MAIS GUERRA,
REINARIA PAZ NA TERRA
TODOS SERIAM FELIZES".
Quando o príncipe
Siddarta
interrompeu seu sermão,
toda a assembléia, em silêncio,
tributou-lhe aprovação.
Então, o rei levantou-se
juntou as mãos e curvou-se
saudando-o como a um irmão.
.
Nesta altura, os sacerdotes
curvaram-se envergonhados,
derrubaram um por um
seus altares inflamados
jogando fora os punhais
com que há pouco os animais
estavam sendo sangrados.
.
No outro dia, Bimbisara
que era um rei muito correto
mandou sua assessoria
elaborar um projeto
que ele transformou em Lei.
Eis o que dizia o rei
no texto de seu decreto:
.
FICA, A PARTIR DESTA DATA,
DECRETADA A PROIBIÇÃO
NOS ESTADOS E PROVÍNCIAS
DE TODA NOSSA NAÇÃO,
DE SE MATAR ANIMAIS,
SEJA PARA RITUAIS
OU PARA ALIMENTAÇÃO.
.
Querendo dar a Siddarta
prova de agradecimentos,
Bimbisara ofereceu-lhe
os melhores aposentos
e mais a sua amizade,
pra ele ficar na cidade
transmitindo ensinamentos.
.
Siddarta agradeceu muito
as ofertas imperiais,
mas disse que o seu destino
não era as pompas reais
nem as luzes da cidade.
Ia em busca da Verdade,
precisava saber mais.
.
Disse-lhe o rei: Não nasceste
para viver no abandono,
mendigando pelas vilas
pobre como um cão sem dono.
Terás o meu reino inteiro,
pois como eu não tenho herdeiro
Tu herderás o meu trono".
.
— "Já que insistis — disse Buda —
com a maior humildade —
Eu também tive o meu reino,
trono, esposa, propriedade
e a tudo renunciei,
para conhecer a Lei
e procurar a Verdade.
"As montanhas são
meu Lar,
a natureza é o meu této.
Um dia, se eu descobrir
a Luz do Saber Correto,
virei por aqui de novo
para ensinar vosso povo
e resgatar vosso afeto".
.
Vendo que a sua insistência
de nada lhe adiantasse,
o rei abraçou o príncipe,
depôs-lhe um beijo na face,
despediu-se sorridente
desejando ardentemente
que Siddarta triunfasse.
.
Já se passaram seis anos
de pesquisas incessantes,
de vigílias, de jejuns
e meditações constantes.
Siddarta permanecia
buscando a Sabedoria
e com a mesma sede de antes!
.
Na .saída da cidade
soube, de fontes diretas,
que nos bosques da montanha
havia sete profetas,
homens de ciência rara,
que eram Udra e Alara
com cinco outros ascetas.
.
Foi conversar com os sábios,
ponderou suas verdades,
discutiu seguidamente
com as sete celebridades
sobre a parte exotérica
e toda a ciência esotérica
dos Vedas e Upanixades.
.
Achou bastante profundo
o que esse grupo ensinava,
mas não era, essencialmente,
o que Siddarta buscava.
Despediu-se dos ascetas
sem as resposta concretas
que a sua alma procurava
.
A cada instante sentia
que a busca não era vã.
Atingiu o rio Ganges
um dia pela manhã.
as águas se misturavam,
pois dois rios se encontravam
— o Mohana e o Vilajan.
.
Tomou um banho e seguiu
sem destino, a caminhar,
até que uma intuição
lhe apontou para um lugar
e ele partiu confiante:
era o ponto culminante
da montanha Barabar.
Ali, ficou alguns
meses
meditando noite e dia.
Entre a vigília e os jejuns
o seu tempo dividia,
dormia uns poucos minutos
e só comia alguns frutos
que a terra lhe oferecia
.
Certa tarde adormeceu
tão fraco e tão abatido
que permaneceu no sol,
prostrado, desfalecido.
Tão magro o seu corpo estava
que quem o visse pensava
que ele tivesse morrido.
.
Foi salvo por um pastor
vindo das bandas do Norte,
que lhe deu leite de cabra
e o retirou do sol forte.
Se não fosse aquela ajuda
certamente o Senhor Buda
teria encontrado a morte.
.
Quando o príncipe acordou
o pastor tinha partido,
viu que o tiraram do sol,
sentiu que tinha comido,
estendeu o olhar de monge,
viu seu salvador lá longe
e o saudou, agradecido.
.
De outra feita, meditava
sob uma árvore, sentado,
no mais completo silêncio
quando se viu despertado
por acordes musicais
que eram como madrigais
ao seu ouvido apurado.
.
Olhou e viu que era um grupo
de músicos e bailarinas
com seus vestidos bordados
e meias de sedas finas:
uma verdadeira festa,
um bailado na floresta,
um sonho em meio às colinas
.
Adiante, o grupo parou
de tocar e de dançar
e uma das dançarinas
veio ao músico avisar:
afina a citara pra nós
na altura de nossa voz,
que agora vamos cantar.
.
A dançarina insistia
para que a afinação
não fosse alta nem baixa,
mas em um diapasão
em que existisse harmonia
entre o que a cítara dizia
e o que falava a canção.
Quando o grupo foi-se
embora
envolto em sua alegria,
Siddarta pôs-se a pensar
sobre o que a moça dizia:
"HARMONIA, AFINAÇÃO...
O QUE FALAVA A CANÇÃO...
O QUE A CÍTARA DIZIA"...
.
Contemplou seu corpo magro
sobre a pele ressequida,
fitou o céu e falou
da forma mais decidida:
devo ter exagerado,
talvez eu tenha esticado
demais as cordas da vida...
.
"Os meus olhos estão turvos,
embora eu veja a Verdade,
sinto que não vou ter forças
na hora da necessidade.
Vou poupar a minha vida
para entregá-la em seguida
à causa da Humanidade!
.
Na cidade de Senani
ficou uma temporada,
quando sentiu que a saúde
já estava recuperada
partiu dali para Bear
onde, enfim, iria achar
a meta tão almejada
.
Nesta altura, era tão forte
o seu poder de vidência
que ao avistar uma árvore
teve plena consciência
que aquela copa frondosa
era a ficus religiosa
ou a Árvore da Ciência...
.
Dirigiu-se para a árvore
num passo determinado,
olhou para o firmamento
e fez seu voto sagrado:
"AGORA, EU ME SENTAREI
E DAQUI SÓ SAIREI
OU MORTO OU ILUMINADO!"
.
Aqui, meu caro leitor,
nós vamos ter que parar.
Você vai respirar fundo,
eu também vou respirar,
pra ver se a gente consegue
extrair do que se segue
o que há para assimilar...
.
Talvez me faltem palavras
porque a linguagem humana
é pobre para expressar
qualquer coisa soberana,
quanto mais para exprimir
o que alguém possa sentir
ao penetrar no NIRVANA!
Como expressar em
palavras
de modo a ser entendido,
o estado em que a gente ouve
sem utilizar o ouvido,
enxerga sem a visão,
sente toda sensação
sem usar nenhum sentido?!
.
Como descrever a voz
aparentemente muda
do silêncio absoluto
que escutava o Senhor Buda?,
o som que ninguém escuta,
a luta que não é luta,
a mudança que não muda?!
.
Como explicar uma Luz
que está sempre a iluminar,
envolve a todos os seres,
clareia em todo lugar,
brilha em todos os sentidos,
mas somente aos escolhidos
é dado vê-la brilhar?!
.
Vejamos até que ponto
poderei, leitor amigo,
sem falsear a verdade
nem vacilar no que digo
mostrar o que o Buda viu,
percebeu, ouviu sentiu
e o que se passou consigo:
.
Logo que Ele se sentou
um sol imenso o envolveu,
todo o céu iluminou-se,
a terra inteira tremeu.
Riram-se os santos e os Devas
porém Mara — o rei das trevas —
lá no inferno estremeceu.
.
Mara — que quer dizer diabo
no idioma dos hindus —
quando viu Buda sentar-se
convocou seus belzebus
e ordenou lhes sem rodeio
pra evitar por qualquer meio
que o Mestre encontrasse a Luz!
.
Mara sentia estar próximo
o final de seu reinado,
pois sempre que um Avatar
se torna um Iluminado,
prova que o diabo é ilusão
e, ao vencer a tentação,
desmoraliza o pecado
.
Por isto, o interno de Mara
tornou-se um Deus-nos-acuda:
chamou todos os demônios
e exigiu-lhes sua ajuda,
mandou que se disfarçassem
e a todo custo evitassem
a Iluminação de Buda!
Primeiro, veio o
egoísmo
disfarçado de bomzinho
e disse ao Buda: “Está bem
vou te mostrar o caminho
desde que tu te ilumines,
mas a ninguém mais ensines —
Sejas Buda tu sozinho"!
.
Mas Buda, reconhecendo-o
rechaçou-o com firmeza:
"NÃO CONSEGUES ME ENGANAR,
CONHEÇO A TUA ESPERTEZA,
SÓ ILUDES AOS QUE TE AMAM E A SI MESMOS SE PROCLAMAM
COMO DONOS DA CERTEZA".
.
E assim desfilaram todos
os mais temíveis pecados:
o orgulho, a concupiscência,
os prazeres desvairados,
o ódio — o mais triste deles —
Buda venceu todos eles,
foram todos derrotados.
.
Nessa primeira vigília
vieram raios e tufões,
relâmpagos, tempestades,
tremor de terra, trovões,
tudo isto Mara mandava,
mas Buda continuava
entregue as meditações.
.
Já na segunda vigília
foi enviada por Mara
aquela que, para Buda
era a lembrança mais cara:
mandou-lhe uma bailarina,
linda, esplêndida, divina,
disfarçada em Yasodhara.
.
Na visão ela dizia:
"Vem, me beija, és o meu dono,
não vês, príncipe, que morro
devido ao teu abandono?
Vem, nosso leito te espera,
deixa toda essa quimera
e volta pro nosso trono".
.
Mas Buda identificou
naquela visão tão clara
que procurava envolvê-lo
na forma de Yasodhara,
mais um fruto da ilusão,
mais uma maquinação .
da astúcia incrível de Mara.
.
Quando Siddarta venceu
os pecados capitais
recolheram-se aos abismos
as legiões infernais
e Ele viu que inferno e céus
não são mais que simples véus,
sonho, ilusão, nada mais!
Veio a terceira
vigília:
liberto das tentações,
Siddarta viu claramente
suas peregrinações
(lutas, vitórias, tormentas)
era um total de quinhentas
e cinquenta encarnações.
.
Nas vidas anteriores
viu seus bons e maus auspícios,
florestas, pântanos vales,
cavernas e precipícios,
prazeres, vicissitudes,
e o triunfo das dez virtudes
sobre a escravidão dos vícios.
.
Viu como, em cada existência,
colhia implacavelmente
o que havia semeado
na existência precedente,
e a Justiça que o céu dá
não é boa nem é má,
Mas Justiça....simplesmente!
.
Na altura da meia noite
veio a mais bela visão:
Buda entrou noutras esferas
onde sóis em profusão
iluminavam as vidas
de galáxias escondidas,
numa quarta dimensão...
.
Viu satélites girando
de maneira invariável
em torno de seus sistemas,
cada um mais formidável,
tudo obedecendo a um plano
infinito, soberano,
preconcebido e imutável!
.
Milhões de mundos rodando
à extrema velocidade,
se formando e se extinguindo
com uma regularidade
capaz de causar espanto,
separados, e, entretanto,
Integrando uma Unidade!...
.
Transpôs cimos, profundezas,
desvendou estratosferas,
viu atrás das aparências,
ouviu além das esferas,
foi aos abismos mais fundos,
habitou todos os mundos,
viveu em todas as eras...
.
Ele, que já tinha visto
a Lei de Causa e Efeito,
viu a Lei da Evolução
melhorando o que está feito,
Fazendo o Grande — MAIOR,
Tornando o Bom — no MELHOR,
fazendo o Melhor — PERFEITO!
Viu que a mão do
Absoluto
— essa Lei sempre imutável —
constrói, conserva, destrói
de maneira inexorável,
depois, volta a construir,
conservar e destruir
cumprindo um ciclo infindável.
.
Durante a quarta vigília,
já com sua alma liberta
e a super consciência
inteiramente desperta,
Siddarta perceberia
o que, por certo, seria,
sua maior descoberta:
.
As QUATRO NOBRES VERDADES
que iriam ser a semente
de sua Filosofia
vieram simultaneamente
puras, claras, cristalinas,
como emanações, Divinas
pousadas na sua mente!
.
Primeiro, ele percebeu
que A DOR É A SOMBRA DA VIDA
e, aí, pode ver a DOR
claramente refletida
na face da Humanidade.
Era a Primeira Verdade
que ficava esclarecida.
.
Pensou na CAUSA DA DOR
e percebeu num lampejo
e, ao perceber, proclamou:
""Sim, é claro, agora eu vejo,
as dores que ao mundo afligem,
todas elas têm origem
nas sensações, no DESEJO!
.
Estava assim descoberta
sua Segunda Verdade:
Sensação gera desejo,
desejo gera ansiedade,
ansiedade é dor, conflito,
e assim até o Infinito
e por toda a Eternidade!
.
Aprofundou ainda mais
a sua meditação,
viu a Terceira Verdade
brotar no seu coração
vinda da Fonte da Vida,
pode bem ser resumida
nesta simples equação:
.
Sabendo que A VIDA É DOR
e A DOR VEM DA SENSAÇÃO,
quem perceber que os sentidos
não passam de uma ilusão,
sublima a existência humana
entra na paz do Nirvana
e alcança a libertação...
A Quarta Nobre Verdade
aponta o caminho ou Via
de Oito etapas, que resume
o cerne e a Filosofia
do Budismo original
— profundo manancial
de pura sabedoria!
.
Essa Estrada de Oito Vias
nem sempre é bela e florida,
tem desvios, precipícios
—como os caminhos da vida —
exige muita prudência,
retidão e paciência
pra poder ser percorrida.
.
É o caminho tortuoso
pontilhado de aflição,
mas, como tudo o que é duro
tem sua compensação:
é a Estrada que conduz
à Paz, à Verdade, à Luz
e à Verdadeira União.
.
Finalmente, é a Grande Via
pela qual a Raça Humana
livre das superstições
caminhará soberana,
encontrará Liberdade,
vislumbrará a Verdade
e atingirá o Nirvana!
.
As primeiras Quatro Vias
são mais simples, mais diretas,
visam todas as criaturas
— cultas ou analfabetas.
Seus quatro preceitos são:
CRENÇA, PALAVRA, INTENÇÃO
e mais CONDUTA corretas!
.
As segundas quatro vias
mais difíceis, mais completas
destinam-se mais aos monges,
aos discípulos e ascetas
Constam de: MEDITAÇÃO,
PENSAMENTO, SOLIDÃO
E a pureza corretas!
.
Neste ponto, o Senhor Buda
foi voltando aos seus sentidos.
Apalpou o próprio corpo
com seus dedos doloridos,
experimentou o tato,
provou o gosto e o olfato
e apurou bem os ouvidos.
.
Por último, abriu os olhos
sob a árvore bendita
vivendo uma sensação
tão Divina, tão bonita,
tão forte, tão colorida,
que poderá ser vivida,
mas não pode ser descrita!
Ergueu-se, respirou
fundo,
caminhou pelo deserto.
Agora, sim, era O BUDA,
o DUAS VEZES DESPERTO,
Liberto dos sofrimentos,
da roda dos Nascimentos
e Mortes, enfim LIBERTO!
.
Atravessou a montanha
pregou em vários lugares
Escolheu cinco discípulos
da cidade de Benares,
Falou-lhes seguidamente
e os instruiu verbalmente
nas verdades basilares.
.
Depois, no parque dos Gamos
cinquenta e quatro senhores
e mais o príncipe Yasad
tornaram-se seguidores
do mestre amado e singelo,
vestiram o manto amarelo
e foram ser pregadores.
.
Aos sessenta novos monges
Buda entregou com carinho
as Verdades e os Princípios
escritos num pergaminho
e pediu-lhes que viajassem
pregando aos que desejassem
sobre as Vias e o Caminho.
.
Já fazia sete anos
que Siddarta se ausentara
das terras de Suddhodana,
de Channa e de Yasodara.
Era tempo de voltar,
mas, antes, quis visitar
o reino de Bimbisara.
.
Na cidade florestal
permaneceu alguns dias
pregando as QUATRO VERDADES
e o Caminho de OITO VIAS.
Enquanto Buda pregava
a cidade fervilhava
em constantes romarias.
.
Como fruto imediato
dessa rápida passagem,
mais 900 discípulos
apreenderam a mensagem,
fizeram suas opções,
receberam instruções
e empreenderam viagem.
.
Nessa altura, Suddhodana
já tinha sofrido horrores:
mandara nove recados
por diversos portadores,
mas seus homens não voltavam
ouviam Buda e ficavam
tornavam-se seguidores.
Na mesma situação
se encontrava Yasodhara:
mandou vários emissários,
diversas cartas mandara.
Nem emissários nem carta,
todos acharam Siddarta,
mas nenhum só regressara.
.
Por fim, o rei Suddhodana
botou numa carruagem
o seu ministro Udaiy
e instruiu o personagem,
solicitando-lhe ajuda:
entregar em mãos de Buda
sua décima mensagem.
.
Junto ao Jardim dos Bambus
uma grande multidão
contemplava o Senhor Buda
sentado em meditação.
O ministro aproximou-se,
sentou-se aos seus pés, curvou se
e pôs-lhe a carta na mão.
.
Na hora em que o Senhor Buda
voltou novamente a si,
leu a mensagem do rei
e falou para Udaiy:
"Ide e anunciai ao rei
que irei, certamente, irei
logo que eu partir daqui.
.
Quando o rei anunciou
que Siddarta voltaria
houve em Kapilavastu
uma explosão de alegria
desde a cidade à floresta,
todo o povo entrou em festa
a partir daquele dia.
.
Deixo a critério, leitor,
de sua imaginação,
ver a pompa, o luxo, o brilho,
o requinte, a ostentação
com que o rei se preparou
e a cidade engalanou
para aquela recepção!
.
Ergueu pavilhão de flores
no portão Sul do reinado,
o caminho até o palácio
foi todo ele atapetado
de rosas, cravos, jasmim,
sândalo, lírio e alecrim
— era um Éden perfumado.
Para tornar o percurso
mais enfeitado e mais belo,
escolheu 100 bailarinas
que, vestidas de amarelo,
dançariam num bailado
desde o pavilhão dourado
até o portão do castelo!
Yasodhara preparou-se
com todo esmero e cuidado
vestiu seu vestido de ouro
que há muito estava guardado,
Chamou seu filho — Raul —
e foi para o portão sul
esperar seu bem-amado!
.
Mandou ocultar o carro
por detrás de um arvoredo
e ali deixou-se ficar
escondida, desde cedo,
os olhos fixos na estrada,
tremendo, descontrolada,
com alegria e... com medo!
.
Passava do meio dia
quando ela viu um ermitão
pedindo esmolas nas casas,
passos firmes, pés no chão,
a túnica amarelada,
com a cabeça raspada
e uma marmita na mão.
.
Notou que dois outros monges
lhe faziam companhia
os três caminhavam juntos,
porém só ele pedia,
viu que as casas se fechavam
e as pesssoas se juntavam
à multidão que os seguia.
.
Quando Ele se aproximou
à frente do povaréu,
a princesa, ainda em dúvida,
levantou-se, ergueu o véu
reconheceu-o e, por fim,
prostrou-se e ficou assim
como quem entra... no céu!
.
Abraçou-o e, nesse abraço
percebeu um novo encanto,
uma sensação diversa
da que antes sentira tanto:
não era o abraço do homem
a quem as paixões consomem,
era o abraço do Santo.
.
Em vez da ardência e calor
daquela paixão voraz
que envolvia os seus abraços
há sete anos atrás,
agora, apenas sentia
emanações de alegria,
vibrações de pura paz.
.
Num relance, Yasodhara
sentiu que sua ansiedade
transformou-se em um estado
de plena serenidade.
Naquele abraço tão casto
sentiu um amor bem mais vasto
porque era amor de verdade.
Quando o rei soube que
o filho
chegou feito um ermitão
pedindo esmolas aos pobres,
deu trinta murros no chão
decidido a espinafrá-lo,
esporeou seu cavalo
e foi para o pavilhão.
.
Mas seu ódio foi cedendo
quando viu a multidão.
Era uma avalancha humana
vindo era sua direção.
Tratou de ir-se desmontando
e foi a pé, caminhando,
no rumo da procissão.
.
Quando Siddarta o avistou
lançou-lhe um olhar tão pleno
de bondade, de ternura,
tão divino, tão sereno,
com tanto amor o abraçou
que ali mesmo o rei parou
de destilar seu veneno.
.
Mesmo assim, ainda lhe disse:
"Por que fizeste isto, filho?
Eu engalanei teu reino
com toda essa pompa e brilho
para gozá-lo contigo
e voltas feito um mendigo
pobre, roto, maltrapilho?!”
.
Buda caminhava altivo
como em estado de Graça.
Parou, contemplou o povo
comprimido em meio à praça
e disse ao rei: "ESCUTAI,
ESTE MEU TRAJO, MEU PAI,
É O TRAJO DE MINHA RAÇA!"
.
O rei, porém, retrucou:
"Tua raça é menos modesta!
Pertences a uma linhagem
que teve cem reis à testa!
Cem tronos te precederam,
cem reis nos antecederam!
Não! Tua raça não é esta"!
.
— NÃO VOS REFIRO, MEU PAI,
MINHA LINHAGEM MORTAL,
MAS A MINHA DESCENDÊNCIA
INVISÍVEL, MAS REAL,
DOS BUDAS — ILUMINADOS —
OS ANTIGOS E OS PASSADOS,
A MINHA ESTIRPE IMORTAL!
.
"NÃO PRETENDO VOS MAGOAR
NEM CAUSAR QUALQUER DESDOURO,
MAS ESTE MANTO AMARELO
— QUE É MEU ÚNICO TESOURO —
É O TRIUNFO DA PUREZA
SOBRE AS POMPAS E A RIQUEZA
DE QUALQUER IMPÉRIO DE OURO!
"O IMPÉRIO QUE EU
VOS TRAGO
É O IMPÉRIO DA HUMILDADE,
DO AMOR, DO BEM, DA VIRTUDE,
DA PAZ. DA FRATERNIDADE,
DA RENUNCIA, DA ALEGRIA,
DA FÉ, DA SABEDORIA,
- É O IMPÉRIO DA VERDADE!
.
IMPÉRIO DE QUEM TRIUNFOU
SOBRE TODAS AS PAIXÕES,
TRIUNFOU SOBRE SI PRÓPRIO,
SEUS DESEJOS E AMBIÇÕES,
SOBRE O DESTINO E A SORTE,
SOBRE A VIDA, SOBRE A MORTE
E TODAS AS ILUSÕES!
.
Quando Buda silenciou
notou com toda clareza
lágrimas de compreensão
nos olhos de sua Alteza.
Caminhou transfigurado
Conduzindo o rei, de um lado,
e, do outro, o filho e a princesa.
.
Na fronte do Senhor Buda
brilhava uma aura lilás.
E assim entrou no palácio,
seus parentes logo atrás
e a partir daquele dia
todos entraram na Via
do Amor, da Luz e da Paz!
.
Depois de ficar uns dias
junto aos seus familiares,
pregou a uma multidão
que se contava aos milhares.
Foi uma noite de glória
que permaneceu na História
como o SERMÃO DE BENARES!
.
Contam os livros antigos
que a noite era enluarada
e que a Cidade dos Templos
estava superlotada
já há mais de uma semana.
Toda a nação indiana
lá estava representada.
.
Buda curvou se ante e povo,
depois, sentou-se no solo.
O rei sentou-se à esquerda
sem pompa, sem protocolo
e Yasodhara à direita
feliz, em paz, satisfeita,
com o seu filho no colo.
.
Buda começou falando
das QUATRO NOBRES VERDADES
seu sentido, seus valores,
suas generalidades
e explicou uma por uma
sem se esquecer de nenhuma
as suas finalidades.
Explicou como
aplicá-las
para vencer as paixões,
como é possível vencer
sofrimentos e aflições,
como encontrar a Verdade,
a Paz e a Felicidade
dominando as sensações.
.
Esclareceu com exemplos
a Lei de Causa e Efeito,
mostrou como o homem recebe
conforme o que tiver feito
noutras vidas, no passado:
colhe o mal se agir errado,
colhe o bem se agir direito.
.
Segundo essa Lei tão sábia
Cada um é o seu juiz:
não pode dizer que é pobre
ou mau porque Deus o quis.
Conforme AGE, FALAl e PENSA
terá sua recompensa,
será feliz ou infeliz...
.
Mostrou como funciona
a Lei da Evolução:
como tudo que é criado
se encontra em transformação,
cresce, se expande, evolui,
murcha, contrai-se, involui,
volta ao seio da Criação!
.
Dissertou sobre os pecados:
o orgulho, a intolerância,
a gula, a inveja, o ódio,
luxúria, apego, arrogância
e mostrou que todos eles,
sem excluir nenhum deles
resultam da ignorância.
.
Mostrou, depois, que a Virtude
funciona do mesmo jeito,
ou seja, o ignorante
da Lei de Causa e Efeito
vive num emaranhado
entre a virtude e o pecado
sem saber o que é direito...
.
Explicou em termos simples
úteis para o dia-a-dia
o Caminho de Oito Etapas
mostrando via por via
de maneira que a assistência
entendesse toda essência
da sua Filosofia.
.
Encerrou o seu discurso
ensinando a multidão
os cinco preceitos-chave
para a purificação,
um verdadeiro tesouro —
são as cinco regras de ouro
pra atingir-se a perfeição.
A primeira dessas
regras
se resume simplesmente
em: NÃO MATAR OU FERIR
A QUALQUER SER VIVENTE.
Plantas, pedras e animais
têm existências iguais
as existências da gente.
.
A segunda é: NÃO TOMAR
COISA ALGUMA A SER ALGUM
POR FRAUDE OU POR VIOLÊNCIA,
NÃO ROUBAR A HOMEM NENHUM.
Se só possuis um pouco de dinheiro,
os milhões do mundo inteiro
valem menos que o teu UM ..
.
A regra número três
para o homem evoluir
é: FALAR SEMPRE A VERDADE,
não caluniar ou trair
jamais a pessoa alguma
sob hipótese nenhuma.
em resumo: NÃO MENTIR!.
.
A regra número quatro
preceitua e especifica:
EVITAR TODAS AS DROGAS
E TUDO QUANTO INTOXICA.
O corpo é um templo sagrado:
se ele está purificado
a alma se purifica.
.
Finalmente, a quinta regra
prevê com toda a clareza:
RESPEITO A MULHER ALHEIA
para viver em pureza
não cometendo jamais
quaisquer pecados carnais
contra as Leis da Natureza!
.
Durante uma noite inteira
a sua voz cristalina
pregou o amor e a renúncia
— bases de sua Doutrina.
Nem seu filho cochilava
como a dizer que aceitava
aquela herança Divina...
.
Nunca, na história do mundo
se ouviu discurso mais belo!
Quando ele acabou, o rei
beijou-o de modo singelo,
fez-se um de seus companheiros
e quis ser um dos primeiros
a usar o manto amarelo.
.
Depois dessa noite histórica
despediu-se de Benares
e por quarenta e cinco anos
pregou em templos, altares,
vilas, fazendas, cidades,
levando as Quatro Verdades
aos mais diversos lugares.
Aos 77 anos
Buda — o exemplo da Virtude —
estava em Kusinagara,
mesmo na Província de UDH
e previu seu desenlace
muito embora ainda gozasse
de absoluta saúde!
.
Uma certa madrugada
do Ano 620,
Buda chamou um discípulo
que foi seu único ouvinte
e, num tom de voz bem suave,
naquele momento grave
lhe transmitiu o seguinte:
.
"Cumpriu-se a minha missão.
Dentro em pouco partirei.
Vós e os vossos companheiros
Sabeis tudo o que ensinei.
Tomai meus ensinamentos
e pregai aos quatro ventos
A Estrada, a Verdade, a LEI"!?
.
O monge saiu correndo
para avisar aos demais,
mas a'alma do Senhor Buda
já não era entre os mortais,
pairava em pleno Nirvana,
livre da cadeia humana,
nas regiões siderais!
.
Passados vinte seis séculos,
um terço da Humanidade
em todos os Continentes
cultua com humildade
nas mesquitas e nos templos
os seus & imortais exemplos
de ETERNO AMOR À VERDADE!
.
Desculpe, amigo leitor,
as falhas do meu relato.
entrou por perna-de-pinto,
saiu por perna-de-pato,
O Rei mandou-me dizer
pra nunca mais me meter
Nos mistérios do Budato...
.
OM! Shanti, Shanti, Shanti!
.
FIM
Paraíba, Brasil, 1977